18 de abril de 2024
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34º e 43° em concurso, parentes de juízes conseguem cargo no Tribunal de Justiça de Manaus

Tribunal de Justiça esticou concurso para garantir vagas a filhos de desembargadores

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O site The Intercept Brasil, revela esquema de nepotismo no judiciário no estado de Manaus (AM). Toda a manobra foi revelada nesta madrugada de segunda-feira (1 de julho), após três parentes de juízes tentarem concurso no Amazonas e não passarem no certame.

A tentativa justa não dando certo, os jovens formados em Direito em 2015 no Amazonas, sentiram o gosto da injustiça. Na época um concurso do Tribunal de Justiça amazonense oferecia R$ 24,6 mil e tinha 23 vagas para juízes.   

Os reprovados no concurso, dois deles os gêmeos Igor e Yuri, filhos da desembargadora Nélia Caminha e Rebecca Ailen Nogueira, sobrinha do desembargador Lafayette Vieira, corregedor do tribunal. 

Se fossem pelo meio justo, os jovens jamais teriam assumido os cargos naquele ano, já que os gêmeos ficaram em 34º e 43º e a sobrinha na 51ª posição. Nenhum dos três teriam a mínima chance de entrar, não pelos meios justos, mas sendo parente galgaram um largo privilégio em relação aos colegas com os quais concorreram.

Conhecedores da lei, recorreram ao edital do concurso, que trazia, a possibilidade d aumentar a quantidade de vagas, caso houvesse “necessidade de serviço”. Para isso, seria necessário a presidência da casa mexer no orçamento. O The Intercept, revelou em gráficos, como funciona todo o esquema de famílias favorecendo parentes.

A matemática é apavorante, conforme o levantamento, 27 juízes, desembargadores e funcionários do judiciário amazonense dividem sobrenomes. 19 dessas pessoas foram indicadas à cargos de confiança que pagam gratificação, há até aqueles que jamais concorreram a um concurso público.

Os nomes foram confirmados pela assessoria de imprensa do tribunal de Manaus. No Amazonas o Tribunal de Justiça comporta 26 desembargadores e 173 juízes.

Os gêmeos Igor e Yuri, filhos da desembargadora Nélia Caminha.  

O caso dos três jovens que não passaram no concurso, se deu após reunião realizada uma semana após a publicação do resultado do concurso. Acompanhados pela mãe, desembargadora Nélia Caminha, um dos gêmeos participou dessa reunião com o presidente do tribunal da época, desembargador Flávio Humberto Pascarelli. 

Um dos presentes na reunião revelou ao The Intercept, que na ocasião, havia a necessidade de se agilizar a nomeação de novos juízes.

O que resultou dessa reunião? O tribunal encaminhou à Assembleia Legislativa do Amazonas, projeto de lei criando 12 cargos de juízes auxiliares. Curiosamente a proposta foi aprovada com unanimidade. 

O gêmeos e a sobrinha dos desembargadores eram pessoas de sorte. Em janeiro de 2018, cinco candidatos desistiram das vagas do concurso. Com isso, o tribunal achou espaço para mais juízes. Até aquele dia, Rebecca havia sido a última a conquistar a vaga.

Rebecca, a juíza nomeada em 51º lugar no último concurso do tribunal, é neta de um desembargador aposentado e tem outros dois parentes no tribunal. Foto: Reprodução/YouTube. 

A posse ocorreu numa festejada solenidade no tribunal. Os desembargadores Nélia e Lafayette acompanharam a cerimônia. A mãe estava orgulhosa pelos filhos, e o tio emocionado com a sobrinha. O site Fatos Marcantes a descreveu como “o feito de famílias que têm em seu gene o dom da magistratura e tiveram mais de um membro aprovado em um dos concursos mais difíceis no país”, ovacionou.

“Esticar” um concurso tão além das vagas iniciais não é ilegal, mas “causa estranheza”, como comentou o constitucionalista e professor da USP Rubens Beçak, que foi consultado pela jornalista Nayara Felizardo, do The Intercept.

Em seu penúltimo concurso para juiz substituto, em 2013, o mesmo Tribunal do Amazonas, por exemplo, ofereceu 31 vagas, mas apenas 19 candidatos foram aprovados e 16 nomeados. Não havia parentes de desembargadores entre eles.

Mas, tais atitudes são vistas como sendo comuns do Estado. A fala de um advogado ao site, revela que o medo é o que mantem todos por lá calados ante as afrontas a lei. 

 “Logo após a Constituição de 1988, os concursos passaram a ser organizados pelo próprio tribunal. Por isso, muitos dos desembargadores de hoje receberam ajuda dos parentes para serem nomeados. Agora, essa ajuda vem na prática de chamar todos os classificados no concurso, até chegar a vez dos filhos dos magistrados entrarem.”, declarou o profissional que teve identidade preservada, por medo a represálias.

O tribunal de Manaus disse que o número de juízes teve de ser aumentado devido à falta de juízes substitutos no estado.

OUTROS R$ 12 MIL NA CONTA 

Embora grave, o possível beneficiamento de familiares de desembargadores em concurso público não é o único problema envolvendo parentes no Tribunal de Justiça do Amazonas. Entre os 12 desembargadores do tribunal que possuem “função de confiança” e recebem gratificações, ou seja, acréscimos no salário devido a cargos que dependem de indicação, nove têm parentes em altos cargos.

O desembargador Elci Simões de Oliveira, por exemplo, é o atual ouvidor-geral do tribunal. Ele foi nomeado assim que o seu irmão, o desembargador Yedo Simões de Oliveira, assumiu a presidência da casa, em julho de 2018. A nomeação vai contra uma resolução do Conselho Nacional de Justiça, o CNJ, de 2005, que proíbe a nomeação de parentes de magistrados até o terceiro grau para cargos de confiança ou que paguem gratificação, o que inclui cônjuges, filhos, pais, irmãos e sobrinhos.

O site ainda cita outras famílias todas elas de algumas forma facilitando a entrada de parentes á cargos públicos sejam eles comissionados ou não. 

Veja algumas famílias que agem livremente, indicando parentes em Manaus:  


Os desembargadores Lafayette Carneiro Vieira e Yedo Simões conversam durante sessão do Tribunal Pleno.  Foto: Raphael Alves/TJAM

Assim que se tornou presidente do tribunal, Elci (à esquerda) tornou o irmão Yedo ouvidor do tribunal. De quebra, ele passou a receber R$ 11,8 mil pela função “voluntária”. Foto: Chico Batata/TJAM. 

Fonte: The Intercep_Brasil.